Crónicas do Dr. Gago Coutinho

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O Pai Natal chegou em março

A 28 de Março de 2018 é publicado, no Diário da República, a Portaria nº 212-A/2018, assinada pela nova Secretária de Estado da Saúde, a Dr.ª Rosa Augusta Valente de Matos Zorrinho, ex-presidente da Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo (ARSLVT). 
A referida Portaria debruça-se ao longo de 4 páginas sobre um plano de requalificação das respostas do SNS na área de influência da ARSLVT, sendo a última página dedicada a promessas. 
Um texto que incompreensivelmente passou despercebido no nosso conturbado meio. Por várias ordens de razões. E vejamos o porquê deste meu espanto. 
A Sr.ª Secretária de Estado é membro de um Governo Nacional e exerce a sua atividade com base na total concordância do sr. Ministro da Saúde e no limite do Sr. Primeiro Ministro. 
Ao ler esta Portaria há, pois, um conjunto de perguntas que ficam no ar: 
- Por que publicar esta Portaria para uma Região e não para todas as 5? Será que estes tipos de projetos não existem para as outras 4? Certamente que o critério de Rosa Matos ter sido a ex-presidente da mesma não pode servir de justificativo…
- A Portaria reforça o papel das ARS no futuro, de onde resulta que o Governo pretende reforçá-las e não extingui-las.
- Como pensa o Governo materializar as 23 promessas para novas unidades, seja em construção seja em requalificação?
Ao analisar as 23 promessas, dadas agora como medidas excecionais, constata-se facilmente que a sua maioria já tem anos de adiamento e de não materialização. A sua maioria provém de decisões de governos anteriores e que constituem não novas promessas, mas sim uma lista de promessas adiadas. 
Por este motivo fica claramente uma pergunta no ar: por que motivo resolve o Governo fazer esta lista? Uma única resposta pode ser dada: publicidade enganosa. 
Por que motivo, quase 2 anos depois de ter tomado posse, resolve o Governo fazer uma lista de promessas de decisões já antes tomadas e que entraram num limbo político e decisório? 
Será que o Pai Natal chegou em março e o Ministro da Saúde tenha descoberto uma mina de oiro e resolvido dar prendas a todos?
Ou será mais uma manobra de ilusionismo na qual este Ministro é um especialista conhecido?
Mas se olharmos para a lista de promessas não podemos deixar de fazer uma pergunta: como vão todos estes equipamentos funcionar? Que profissionais vão garantir o seu funcionamento? 
Nos próximos meses o panorama dos recursos humanos na saúde vai estar sujeito a sérias perturbações. Recordemos os menos atentos: 
- O crescimento de recursos humanos na Saúde é controlado pelo rigor orçamental do Ministro das Finanças e não pelas necessidades funcionais das nossas unidades de saúde. 
- A formação médica continua a ser esmagadoramente garantida pelo Estado que se assume como o quase que exclusivo fornecedor de médicos especialistas para o privado.
- Em nome da ideologia marxista (bem sei que se comemora o 200º aniversário do seu nascimento) continua-se a exigir que seja o Estado o único prestador de cuidados de saúde, quando o peso do privado atinge já hoje os cerca de 30% de atos de saúde.
- Antes do verão o quadro de enfermagem será reduzido em grande parte pela passagem das 40 para as 35 horas sem que esse diferencial seja reposto. 
Estão programadas em várias unidades de saúde o fecho de camas, de enfermarias e de unidades por falta de recursos humanos. Só nos dois maiores hospitais públicos de Lisboa   dezenas de camas de unidades intensivos têm já o seu encerramento previsto, entre outras. 
Como é, pois, possível anunciar aberturas por um lado e encerramentos por outro por falta de recursos? Onde vai o Estado buscar recursos para garantir o funcionamento das novas promessas? 
Vai continuar o Estado a querer dar a ilusão que é o exclusivo prestador de cuidados de saúde quando só presta, de forma direta, a 70 a 75% dos portugueses?
Não chega construir. É igualmente necessário saber como vai ser garantido o funcionamento. E esse parece-me ensombrado por negras nuvens. 
Rosa Matos escreveu a sua carta ao Pai Natal e espera pela chegada do trem dos presentes. Ou terá sido Adalberto Campos Fernandes a escrevê-la para que os portugueses acreditassem que ele é ainda o Grande Decisor?

2 de maio de 2018

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