Em três meses, vendidas mais de 5 milhões de embalagens de ansiolíticos e antidepressivos

Em três meses, vendidas mais de 5 milhões de embalagens de ansiolíticos e antidepressivos

"Um povo de brandos costumes." É assim que os portugueses costumam autodefinir-se, mas não só. Lá fora, a imagem de um povo brando nos costumes, tolerante, resiliente, com grande capacidade para se adaptar às situações difíceis, também vence. Mas o que explica então que sejamos o quinto povo dos 29 que integram a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) que mais consome medicamentos ansiolíticos e antidepressivos? Será o medo de sentir a dor psicológica, será o cansaço pelas condições de vida precárias? Será a própria prática médica de prescrição fácil? O que explica que os portugueses consumam este tipo de medicamentos de forma exagerada?
A resposta não chega com certezas. Aliás, Rui Nogueira, presidente da Associação Portuguesa Medicina Geral e Familiar (APMGF), diz mesmo, em tom de brincadeira: "A resposta vale um milhão. Não a tenho. Nem eu e provavelmente nenhum dos meus colegas. Há um conjunto de circunstâncias, desde a prescrição à automedicação, e este é um dos grandes problemas", defende.
O psiquiatra António Leuschner, presidente do Conselho Nacional para a Saúde Mental, concorda que a resposta para esta situação "é multifatorial" e defende mesmo que o sofrimento psicológico dos portugueses deveria ser objeto de estudo, até para se procurar e planear respostas mais adequadas.
O médico diz ser difícil lutar contra "hábitos que estão enraizados na sociedade," um deles o da automedicação. "Há doentes que começam a tomar ansiolíticos porque têm amigos que tiveram os mesmos sintomas que eles - como ansiedade ou perturbação do sono - e tomaram estes medicamentos, porque foram prescritos pelo médico, e que se deram bem. Este tipo de automedicação é um problema, tomo porque o meu pai ou meu amigo tomou e correu bem. Muitos não têm sequer prescrição e se fossem avaliados por um médico ou não tomariam medicamentos ou então teriam de tomar outros."
Acrescentando: "Estamos a falar de substâncias que dão mais tolerância à pessoa para suportar determinada situação, mas que causam habituação, e pode dar-se o caso de a pessoa continuar a tomar sem necessitar. E hoje há outras formas de tratamento e de apoio a alguns doentes que poderiam ver a sua situação ou os sintomas resolvidos sem medicamentos."
De acordo com os dados fornecidos ao DN pelo Instituto Nacional da Farmácia e do Medicamento (Infarmed), de janeiro a março deste ano foram vendidas 2 664 414 embalagens de medicamentos da categoria dos ansiolíticos, sedativos e hipnóticos, e 2 262 530 embalagens da categoria dos antidepressivos, num total de 5 277 144 embalagens.

Fonte:Diário de Notícias, 9 junho 2020

9 de junho de 2020

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