Crónicas do Dr. Gago Coutinho

Crónicas do Dr. Gago Coutinho

Já leram a Lei de Bases da Saúde?

 

A Lei nº 48/90 de 24 de Agosto, também conhecida como Lei de Bases da Saúde, existe há 28 anos.  Aprovada na Assembleia da República, promulgada por Mário Soares e referendada por Aníbal Cavaco Silva. Esta lei enquadradora tem permitido o desenvolvimento de um SNS sustentado, o crescimento do setor privado e a modernização do setor social.

Foi com esta lei que o SNS, criado em 1979, se desenvolveu e atingiu os valores que todos reconhecem. Nacional e internacionalmente. Que surgiram hospitais SA, SPA, EPE. Que as Parcerias Público-Privado (PPP) se desenvolveram. Que surgiram UCSP, USF modelo A e B. Que se conceptualizaram as USF modelo C. Que se criaram SPMS e ACSS. Que melhorámos os indicadores de saúde. Que aumentámos a esperança de vida. E a lista é interminável das vitórias obtidas.

Recentemente, os cidadãos António Arnaut e João Semedo lançaram o livro «Salvar o SNS – uma nova Lei de Bases da Saúde para defender a democracia».

No texto escrito por António Arnaut vem o próprio afirmar que a Lei nº 48/90 vem descaracterizar o SNS e a lei que o criou. Uma reação com 28 anos de atraso.

João Semedo vem afirmar que o que está em causa é o assalto ao SNS pelo setor privado.

E ambos acham que a Democracia está em causa. Que terão no pensamento e no raciocínio para sustentar tal pensamento? Como justificar tal afirmação? Os números do Ministério da Saúde são claros e inequívocos: nunca os cidadãos tiveram tanto acesso a cuidados de saúde. Os indicadores de saúde, no seu global não pararam de melhorar. Existirá então um ataque à Democracia?

E de onde deriva esta notável conclusão? Essencialmente de sistemáticas opções ideológicas privatizadoras. Curiosa afirmação dos dois autores, um militante do PS e outro do BE. Curiosamente dois dos três partidos que compõem o arco da governação.

O que está em causa é garantir saúde de qualidade a todos os portugueses ou o de prestar diretamente esses cuidados?  O que alguns querem é que seja o Estado o exclusivo prestador de cuidados de saúde? E onde existe tal opção? Onde é que o Estado se assume como o único prestador de cuidados? Qual o país? Quais os custos para o Estado de deter a propriedade de todos os meios?

O que querem verdadeiramente os cidadãos? Uma melhor saúde, com mais qualidade, com melhor acesso e com mais equidade. A opção dos cidadãos tem vindo a evoluir. Hoje mais de 30% dos portugueses procuram prestadores privados e sociais. A opção dos médicos divide-se natural e desejavelmente pelos três setores.

Por ideologia ou porque reconhecem que os setores privado e social cresceram na qualidade e acessibilidade? Porque o sistema evoluiu de um modelo em que o Estado garantia e prestava todos os cuidados para um modelo em que o Estado garante globalmente e presta parcialmente. E porquê esta opção? Porque poupa no investimento. Porque permite a existência de uma rede mais de proximidade. Porque permite um melhor acesso com melhor garantia de cuidados. E estas são opções que garantem uma maior sustentabilidade e uma maior coesão social.

É certo que podemos melhorar a atual Lei de Bases da Saúde. O Governo escolheu uma mulher de grande saber e bom senso para o fazer. Maria de Belém. Estou certo que disso dará provas.  

SNS tanto significa Serviço Nacional de Saúde como Sistema Nacional de Saúde. E sempre assim foi.

Ao Estado compete regular o setor da saúde. Adaptando-o sistematicamente às novas realidades sociais. À centralidade no doente. A um maior investimento na educação para a saúde e na prevenção. A uma mudança no que é o seu modelo de financiamento, na sua plurianualidade. Como reorganizar o investimento neste setor diminuindo aquilo que é o subfinanciamento crónico? Alargando e dinamizando novos modelos de gestão e diversificando os prestadores. Olhar para o setor privado e social como complementares do prestador Estado e não como concorrente. Refletindo sobre o papel das autarquias. Atuando mais intensamente como regulador e menos com prestador.

Recentemente, um grupo de 44 personalidades, de um vasto leque ideológico, anunciaram 10 princípios orientadores para a reforma. Recentrando a revisão nos interesses dos cidadãos e não no espartilho ideológico e político a que alguns procuram fazer regredir o nosso sistema de Saúde.

Estou certo que o avanço será no sentido de revitalizar o Serviço Nacional de Saúde pela clarificação do que deve ser o Sistema Nacional de Saúde. E este é um debate que os médicos devem seguir com atenção. Porque parte do seu futuro passa pelas opções finais.

 

 

13 de julho de 2018

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