Crónicas do Dr. Gago Coutinho

Crónicas do Dr. Gago Coutinho

Por onde andam os Centros de Referência ?

Em 2015 Paulo Macedo, ministro da Saúde à data, aprova os primeiros Centros de Referência em Portugal.

Objetivos:
- a criação de unidades altamente diferenciadas;
- a passagem a um modelo organizativo multidisciplinar;
- a definição de um conjunto de padrões de qualidade;
- o desenvolvimento de um modelo de financiamento próprio;

- o incremento a uma maior diferenciação dos centros, quer em expertise quer no suporte tecnológico.

O objetivo era claro: aumentar a multidisplinaridade e a inovação, em patologias altamente diferenciadas e consumidoras de recursos. Simultaneamente, apostar na concentração e potenciar o efeito de caso nessas situações.

Com a criação de Centros de Referência era igualmente claro que se pretendia implementar um modelo clínico diferente, mais centrado no doente e na doença. Pretendia-se uma resposta mais integrada, mais rápida, mais eficaz.

Foram feitos estudos, feitas programações e avançou-se com os primeiros Centros. Entre os primeiros estudos em 2013 e a aprovação dos primeiros centros decorreram dois anos.

Na Europa a denominada European Reference Networks avançou em 2016. Um sistema que junta atualmente 24 redes, 25 países, 300 hospitais e cerca de 900 prestadores.

Portugal foi o primeiro país a legislar sobre Centros de Referência, de acordo com o estabelecido pela Comissão Europeia. Portugal foi o primeiro país a organizar a Conferência Internacional sobre Redes Europeias de Referência, em Lisboa.

E passados estes anos que fez este Governo?

- entregou placas lindas a todos os Centros de Referência, numa fantástica cerimónia, no início do seu mandato;

- aprovou mais Centros;

- destruiu a estrutura de apoio à Comissão Nacional de Centros de Referência, que desapareceu;
- não existe qualquer auditoria científica e técnica aos Centros;
- optou-se por um modelo geral de certificação de qualidade não relevando as diferenças entre as várias patologias;
- usa-se um modelo de certificação de serviços clássicos e não de unidades multidisciplinares;
- o estatuto de Centro de Referência não é tido em conta para justificar contratações, renovação de equipamentos ou introdução de inovação;
- não existe qualquer estrutura de apoio a estes centros para além de uma breve referência no site da DGS;
- o mesmo site que não parece ter qualquer indicação das Redes Europeias de Referência.
- o modelo de financiamento criado é limitado e aritmético.

Passados quase três anos sobre a aprovação dos primeiros centros o sentimento é de desânimo. Aquilo que muitos defenderam como o início de um caminho para a diferenciação tem constituído forte motivo de desalento e de descrédito.
O processo de candidatura é complexo e exigente. Exige trabalho de equipa e de resiliência. Exige uma aposta clara de todas as equipas e das instituições.
Uma aposta em que as equipas acreditaram. Em que pensaram que a diferenciação iria ter um reforço de investimento e de exigência. De permitir que os melhores teriam hipóteses de ver o seu trabalho e o seu esforço devidamente recompensado.
Pobres dos que nisso acreditaram. Até a Ordem dos Médicos com representantes na Comissão Nacional.
Assistiu-se a um claro desinvestimento nos Centros de Referência e ao asfixiar de uma lufada de ar fresco que tinha surgido na anquilosada estrutura do nosso Serviço Nacional de Saúde (SNS).
O Ministério da Saúde devia ter percebido há muito que a atual estrutura do SNS só sobreviverá se mudar. A anquilosada estrutura hospitalar. Os desajustados modelos dos cuidados primários. A sempre insuficiente estrutura dos serviços de urgência.
A inequívoca defesa do SNS passa também inequivocamente por uma mudança estrutural e conceptual e, só mudando, poderemos crescer e continuar a manter o nosso SNS como uma das coisas boas do nosso Estado Social.

12 de junho de 2018

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