IA ainda gera mais perguntas do que respostas

IA ainda gera mais perguntas do que respostas

O debate «Inteligência  Artificial vs Inteligência Emocional» congregou a participação de muitos médicos, que encheram por completo a Biblioteca Histórica da Ordem dos Médicos e intervieram com entusiasmo. O tema suscita paixões e antagonismos e é de facto uma das variáveis mais importantes para ofuturo da sociedade e também Medicina, mas as perguntas ainda são mais do que as respostas.O debate, que teve como oradores Ana Paiva, Patrícia Akester e José Miguel Jara e Luís Campos Pinheiro como moderador, começou com uma saudação do Presidente do Conselho do Conselho Regional do Sul. Paulo Simões sublinhou a importância do tema geral - a inteligência artificial (IA) - e também a forma como o CRS encara as áreas que são mais abrangentes na sociedade, referindo o protocolo que fora assinado momentos antes com a Gradiva Editora, em que um dos objetivos é precisamente a realização conjunta de conferências e debates.
O moderador da sessão lançou o debate referindo o livro que lhe deu o mote - Emoção Artificial, de Jorge Gomes Miranda. Luís Campos Pinheiro considerou que o autor "faz um discurso direto com a inteligência artificial e os algoritmos, admitindo que a emoção entra na inteligência artificial, não sabendo ele que provavelmente já entrou".
Para o Tesoureiro do Conselho Regional do Sul, é interessante debater "os aspetos da emoção, com as suas imperfeições, com a arte… e qual será o lugar destas nos momentos em que a inteligência artificial começar a dominar todo o nosso quotidiano".
Mais tarde, no debate, Luís Campos Pinheiro questionou: "A inteligência é só memória?". No caso de ser só memória, "que é somar os conhecimentos para gerar uma estratégia ou uma peça de arte ou uma emoção, então a IA, que manipula muitos mais dados e concilia esses dados, conhece todas as estratégias possíveis, todas as táticas, todas as guidelines, ou a inteligência é mais do que isso?".

IA pode ajudar a construir uma sociedade melhor

A primeira das intervenções coube a Ana Paiva, professora do Instituto Superior Técnico e group leader do INESC-ID. A especialista traçou um curto histórico e referiu que já trabalha em IA há quase 30 anos, admitindo: "Nunca pensei que a inteligência artificial chegasse onde chegou atualmente".
Ana Paiva explicou que o termo inteligência artificial "surgiu em 1956 no seio de um grupo de cientistas" que revelaram que conseguiriam construir algoritmos, máquinas que conseguem replicar a inteligência nos humanos”.
E recordou que "já lá vão mais de 60 anos e só agora é que foi possível ter alguns resultados" e que "nestes últimos anos criaram-se algoritmos, que usando dados conseguem aprender com esses dados de maneira a replicar mais facilmente o que é a inteligência humana. Por exemplo, algoritmos que permitem, com base em textos, continuar a gerar o texto como o CHAT GPT, ou usando imagens gerar imagens que nunca existiram. Isto é o que se chama inteligência artificial generativa, que tem tido uma aplicação e um impacto enorme nestes últimos anos".
Mas a professora do Técnico coloca a questão que agora surge: "Será que aquilo que está a ser criado tem emoção lá pelo meio? Onde é que está o papel da emoção na criação destes algoritmos e no resultado? Eu considero que as máquinas não têm emoções, as emoções estão nos corpos humanos e aqui como médicos seria estranho seria dizer que as máquinas têm emoção, mas consigo, com as máquinas, replicar comportamentos que nós conseguimos entender como se tivessem emoções. Eu olho para uma imagem gerada e vejo emoção lá por detrás. Não é que a emoção esteja no algoritmo, a emoção estará nos dados que foram usados para treinar o algoritmo e a emoção está naquilo que a pessoa vê e sente quando vê o resultado da inteligência artificial."
Para Ana Paiva a IA "está a mudar o mundo e para as áreas médicas é impressionante aquilo que eu espero que ainda se venha a fazer. Eu acredito muito que os perigos da IA existem, mas a IA pode e deve ajudar a construir uma sociedade melhor, nomeadamente em áreas da Medicina".

A perspetiva jurídica no quadro do diretio de autor

Patrícia Akester apontou naturalmente para "uma perspetiva jurídica no quadro do direito de autor". A jurista explicou que "o direito de autor é um ramo do direito que protege a cultura, a produção cultural, portanto os livros, as músicas, as pinturas, o software também".
De facto, "o direito de autor visa proteger a obra, mas encontra dois problemas no que toca à IA. Por um lado, porque treinam as máquinas, 'enfiam' nas máquinas obras protegidas pelo direito de autor, livros, uma composição musical, um quadro, uma pintura, e, quando isso é feito, viola-se o direito de autor", considerou.
Para Patrícia Akester, "outro problema tem a ver com os outputs", uma vez que "quando se usa a IA e surge um output, um texto, imagem, vídeo, temos outro problema, a ausência de proteção desse output, porque para nós o que sai da máquina não é uma obra, porque temos um sistema de direito de autor que protege em termos judiciais, mas apenas se forem satisfeitos certos requisitos e o primeiro requisito é que tem de haver um autor, o ser humano, e o segundo requisito é de que tem de haver uma obra, é uma criação intelectual, uma criação do espírito humano, o que liga ao lado da emoção".

A ligação da emoção à máquina

O psiquiatra José Miguel Jara propôs que se refletisse sobre a ligação da emoção e da IA. "Se trocarmos um chimpanzé com uma criança humana, a criança humana vai ser certamente o 'chimpanzé' mais inteligente, mas a inteligência até um certo ponto não dá este salto qualitativo e eu acho que é esta a questão da IA. A IA pode ter todas as ligações e mais algumas, mas se não tiver qualquer coisa e essa qualquer coisa é um mistério que eu acho que não está esclarecido", disse.
Deu a seguir o exemplo das "expressões artísticas que têm a ver com o saber que somos, com o saber que existimos", e colocou uma série de questões: "Quando é que a máquina pode adquirir isso? Será que a máquina pode adquirir isso? Nós não sabemos como é que adquirimos isso. A máquina convive connosco. Nós conseguimos, podemos passar isso à máquina? Como?"
O debate teve uma forte participação, com muitas intervenções da assistência. Num tema desta natureza são ainda mais as perguntas do que as respostas e foi isso que a sessão revelou.
 

6 de novembro de 2023

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